quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

Aquecimento político global

Meu novo artigo:


O Financial Times, conhecido jornal britânico ligado ao capital financeiro mundial, elegeu em dezembro de 2018 o bilionário especulador rentista George Soros personalidade do ano, pelos valores que ele representa. Nada mais coerente para o principal jornal das finanças globais.

De acordo com a matéria, a escolha da personalidade do ano sempre decorre das realizações do eleito, no caso, do bilionário especulador. A seleção ocorre, também, pelos valores que o indicado defende.

Presidente do conselho da Soros Fund Management e da Open Society Foundations, Soros é doador de verbas ao Partido Democrata americano e também às “causas progressistas”, informa o veículo de comunicação das grandes finanças mundiais. Resta saber o que o jornal considera “causas progressistas”.

Na verdade, George Soros ganha fortunas incalculáveis com a especulação financeira mundial a curto prazo, enquanto se agrava a crise econômica das nações e sociedades, e é promotor de um conjunto de ideias programáticas conhecidas como a agenda das Políticas Identitárias.

Cujo mote central tem sido a transmutação das questões nacionais e sociais e portanto dos próprios cidadãos, por uma outra visão, a de que o mundo deve marchar para um conjunto de formulações baseadas nas políticas das afirmações das interioridades dos indivíduos.

Das autoafirmações supremas individuais e de grupos, através de variadas características tais como gênero, raça, sexo, meio ambiente etc., com base nas formulações dos chamados “novos filósofos franceses” que adquiriram notoriedade a partir de Maio de 1968.

Com a desregulamentação radical dos fluxos do capital financeiro e com ele o rentismo predador, Soros transformou-se cada vez mais influente em todos os Países. Tem sido responsabilizado por uma série de desestabilizações em várias nações do planeta.

De uma certa maneira, mesmo que bastante contraditória, existe uma certa semelhança entre a cruzada do megaespeculador financeiro George Soros e as novas concepções neotrotsquistas de uma revolução mundial, só que a de Soros seria através das agendas identitárias, com investimentos bilionários.

A sua fundação Open Society possui sedes em muitas cidades, inclusive em São Paulo, que são visitadas por várias personalidades daquilo que muito cientistas políticos denominam a “Nova Esquerda”, aderente às agendas difundidas por Soros e outros especuladores.

Soros, e vários especuladores rentistas, são adversários implacáveis da questão nacional dos povos e se batem pela mais completa e absoluta liberdade dos fluxos globais do capital financeiro, além de uma cultura mundial que lhes dê sustentação, defesa, e ativismo entusiasta, assim como acadêmico e intelectual. Essas duas questões têm sido a principal cruzada de George Soros.

Com o brutal agravamento das condições de vida das pessoas e sociedades, vítimas das políticas econômicas da globalização financeira, índices pífios de crescimento econômico, quando não negativos, desemprego, aumento da criminalidade, sucateamento dos serviços coletivos, como saúde e educação, salários etc., as populações começaram a se sublevar, como os coletes amarelos em Paris. Insubordinações que possuem caráter reativo, não de plataformas políticas programáticas.

Além disso passaram a votar contra partidos políticos que consideram que não os representam, não importa a matriz ideológica, a cor das suas bandeiras.

Nessa situação, que está em pleno movimento, as Agendas Identitárias que identificam o ideário de várias organizações da Nova Esquerda, mas não exclusivamente delas, passaram a ser referência das políticas econômicas da globalização financeira que as sociedades repudiam.

Emmanuel Macron, presidente da França, eleito por uma coalizão dirigida por banqueiros para por em prática as políticas do capital financeiro, resolveu sobretaxar os combustíveis, que vão finalizar nos preços das mercadorias básicas, sob o argumento que seria um imposto a favor da tese, hegemônica, do aquecimento global.

Respondeu-lhe uma irada senhora dona de casa francesa: não me importa o fim do mundo, quero é saber como chegarei com o meu salário cada vez mais minguado no fim do mês.

A grande mídia hegemônica vem tratando essas manifestações de massas, que devem se estender por grande parte da Europa, como de “extrema direita, fascista ou de nacionalistas populistas” com o objetivo de estigmatizar os levantes sociais.

É óbvio que existam elementos de direita, assim como de esquerda ou anarquistas, nas manifestações.

Porém, negar as causas fundamentais das indignações sociais e não as associar às consequências geradas por décadas às políticas econômicas, financeiras dominantes, e dirigidas ao brutal processo de acumulação do capital financeiro, é um erro fatal de avaliação da realidade.

Esses levantes sociais não estavam no radar das principais organizações políticas, de esquerda, centro ou direita, como queiram se auto intitular. Os repúdios sociais podem acontecer através de manifestações de rua ou pela via eleitoral, como foi o caso do Brasil, caracterizam-se como difusas revoltas contra o sistema. E contra aqueles que estão mais visíveis à sua frente.

O problema é que os partidos políticos, inclusive os ditos representantes das agendas identitárias, da Nova Esquerda, não possuem alternativas políticas ou propostas exequíveis às indignações sociais.

Muitos que se situam no âmbito da Nova Esquerda, tornaram-se por inércia ou incompreensão, em partidos considerados como associados ao sistema repudiado. Ficaram, assim, paradoxalmente, conservadores, identificados ao próprio sistema, mesmo que usem retórica e iconografia de “esquerda”.

Faltam-lhes a compreensão, e buscam justificativas para as suas derrotas fora da realidade objetiva, da irritação social crescente, encontram-se sem perspectivas.

As sociedades não vão consultar os partidos de direita, centro, ou da nova esquerda, ou ao “petit roi” o “reizinho dos financistas” Emmanuel Macron, como diz a mídia francesa, e seja lá quem for, para saber se eles concordam ou não com as suas insubordinações.

Porque é exatamente o contrário, as forças políticas é que devem ter a lucidez de compreender as revoltas das sociedades agoniadas com as suas péssimas condições de vida. E aliás, por que deveria ser mesmo o contrário?

As sociedades estão igualmente defendendo sua cultura, valores, percebem, ao seu jeito, que a nação é para elas um bem valioso que deve ser preservado, em detrimento de qualquer pseudointernacionalismo da globalização financeira, que só lhes tem causado danos e prejuízos. Isso é um fato e uma constatação.

À sua maneira, passam a defender a centralidade da importância da Nação em suas reinvindicações essenciais. Podem inclusive eleger figuras “toscas”, “místicas”, reacionárias, “fascistas” que se apresentem como favoráveis às suas reinvindicações, às causas das suas revoltas.

As sociedades também não podem ser responsabilizadas pelos equívocos políticos táticos dos chamados setores progressistas. E por que deveriam? Nem estão preocupadas com isso.

É evidente que se o “toscos”, os “reacionários”, como dizem no Brasil de Bolsonaro, não corresponderem aos seus reclamos, será repudiado nas urnas ou nas ruas, em algum momento mais adiante. Isso é um comportamento da História social dos povos.

Que o diga Macron: promoveu o Eco Imposto sobre os combustíveis contra o aquecimento global e teve como resposta o aquecimento político enfurecido da sociedade francesa.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

180 milhões de brasileiros fora da política econômica, por André Araújo


O Estado inclui a totalidade daquilo que se considera NAÇÃO, inclui a memória do passado, a História do País, a população presente, as gerações futuras, o Estado não é somente um acerto de contas orçamentárias, é muito mais do que isso.



180 milhões de brasileiros fora da política econômica, por André Araújo

Qual o foco da política econômica de Paulo Guedes? São os trinta milhões de brasileiros que têm renda segura e vida financeira estabilizada, e os demais 180 milhões?

São 60 milhões de desocupados, a soma dos desempregados do mercado formal mais os que desistiram de procurar emprego mais os subempregados mais os autônomos biscateiros. Precisa de confirmação? São 64,3 milhões com ficha suja no SERASA, o pobre só perde o crédito quando NÃO tem mais nenhuma renda. Por qualquer lado que se olhe a imensa massa da população brasileira está mal de vida. Qual a mensagem do plano Paulo Guedes para eles? Virem-se, você não estão no radar, não há nenhuma política para os pobres, ao contrário, vamos cortar o máximo em seguro desemprego, bolsa família, aposentadoria por invalidez.

Ministro da Fazenda precisa ter vasta visão de País, de Estado, de povo, de geopolítica, não pode ser um mero operador de bolsa, câmbio e juros. Essa pequenez que aflige hoje o mundo econômico brasileiro com colocação de empresários com foco micro em funções que exigem visão macro e especialmente uma noção de Estado, que é muito diferente de mercado.

O Estado inclui a totalidade daquilo que se considera NAÇÃO, inclui a memória do passado, a História do País, a população presente, as gerações futuras, o Estado não é somente um acerto de contas orçamentarias, é muito mais do que isso.

A SITUAÇÃO DOS POBRES PARA 2019

É visível a olho nu, não é preciso o trabalho profissional do IBGE, para se notar o avanço da miséria, dos desajustes sociais, da desesperança da população brasileira mais carente, desde a classe C que teve no passado emprego e uma perspectiva de melhora de vida, até os muito pobres ou miseráveis, das classes D e E, não só em um arco geral, mas especialmente nas faixas mais jovens. Um vasto contingente de 20 milhões de indivíduos entre 14 e 24 anos sem escolaridade adequada, sem treinamento profissional, sem apoio mínimo para ter alguma perspectiva de futuro. Essa população tinha esperança entre 1950 e 1980, hoje não.

Na nova política econômica não há ABSOLUTAMENTE NADA para essa população de adultos, velhos, jovens e crianças, é como se ela não existisse, ou pior ainda, um estorvo.

O “dream team” dos “Chicago boys” do projeto Paulo Guedes é muito mais pro-mercado do que os economistas do Real, que apesar de neoliberais tinham uma certa visão de País.

Os “Chicago Boys”, portadores de uma teoria econômica inteiramente superada e desconsiderada nos EUA de hoje, fazem questão de não ter visão social alguma, seu inimigo é exatamente o Estado, um ente que para eles nem deveria existir. São inimigos do Estado, no limite eles pretendem que o País não precise de Estado para existir, tampouco reconhecem diferenças entre os países que desenvolveram um estágio maior de economia de mercado, Inglaterra e EUA e países de outra formação histórica como o Brasil, Índia, Rússia e China, onde o Estado tem uma forte raiz construtiva. O Brasil teve Estado antes de ter povo e o Estado é quem criou o País em 1822. Uma outra trajetória que é muito diferente dos Estados Unidos, onde o povo chegou antes do Estado, são formações diferentes.

A cultura da competição, lastro filosófico do neoliberalismo, tem pés de barro no Brasil. O Plano Real criou toda uma aura de desejada competição no setor bancário, com a vinda de bancos estrangeiros como arautos da concorrência. Nada aconteceu. O mercado bancário nunca foi tão cartelizado como hoje no Brasil, após a liquidação dos bancos estaduais sob o pretexto do “Estado mínimo” e com a esperança de que só com bancos privados haveria mais concorrência. O mesmo aconteceu no mercado de combustíveis, acabou o tabelamento histórico, sob o pretexto de aumento da competição, com o que se cartelizou o mercado pelo qual os preços sobem quando a cotação internacional do barril e do dólar sobe, MAS os preços não caem na contramão. De Setembro a Novembro o preço da gasolina na refinaria caiu 46 centavos e nas bombas cai no máximo 4 centavos. Essa é a competição neoliberal em terreno construído por outra lógica cultural onde a moldura de regência tem peso essencial.

A regulação do Estado é fundamental nas sociedades que têm histórico de berço onde não existe o DNA de competição pura do estilo inglês e americano. Essa realidade é reconhecida na Europa continental e se projeta para a América Latina. Querer impor a ferro e fogo uma cultura neoliberal de corte anglo-americano, sendo outras as bases culturais, jamais dará certo. O risco é a importação do pior dos efeitos do neoliberalismo selvagem sem nenhum de seus benefícios civilizatórios. Importam-se os defeitos e as qualidades não se impõem por falta de ambiente cultural e aceitação social, os atavismos são terríveis instrumentos da realidade.

O PODEROSO ESTADO AMERICANO

A Escola de Chicago foi desmontada duas vezes na história econômica dos EUA. Na sua primeira fase, em 1929, quando seu grande mentor, Irving Fisher, disse duas semanas antes do “crash” de 24 de outubro de 1929 que a “economia americana nunca esteve tão sólida”. Isso dias antes da maior crise econômica do século até aquela semana. Desmoralizado, Fisher desapareceu do mapa. A segunda Escola, a de Milton Friedman, foi desmontada na crise de 2008, causado pelo “livre mercado” e resolvida pelo Estado, desconstruindo a mística.

Mas é bom frisar que a Escola de Chicago e suas vertentes nunca foram unânimes nos EUA, nem no seu apogeu nos anos 70 e muito menos agora. As escolas de economia da costa leste, chamada de “salt water schools”, especialmente MIT e depois Harvard, têm hoje muito maior prestígio intelectual do que a Escola de Chicago. Incensada por saudosistas brasileiros, nos EUA de hoje ninguém mais leva a sério suas derrotadas lições. Até mesmo a eleição de Trump, no conceito brasileiro um nacionalista econômico, é contraponto às ideias neoliberais.

Na verdade a História dos EUA teve sempre um forte e sólido Estado a amparar a economia.

Hoje todo o setor agrícola americano existe pela mão do Estado através de subsídios em larga escala, seguro agrícola suportado pelo Estado, crédito à agricultura dado pelo Estado (Commodity Credit Corp.). O enorme incremento do etanol de milho produzido nos EUA só existiu por causa de um super subsídio do Tesouro americano, sem o que o etanol de milho é inviável economicamente. Mas o Estado americano subsidia por razões estratégicas.

Todo o setor de hipotecas de habitação popular nos EUA é estatal, assim como maior parte da geração de energia hídrica (TVA), os trens de passageiros (Amtrak), os aeroportos, portos, transportes coletivos nas metrópoles, bem como saneamento, água e esgoto, rodovias pedagiadas, são estatais, não sob a forma de empresas, mas sim como “entes públicos” com o nome de “Authority”. A presença estatal na economia americana é ENORME, ao contrário do que inventam os “Chicago boys” brasileiros. Hoje, longe de serem “boys”, são velhotes bem gastos e de mente antiquada, démodés, vivem do passado de glórias dos tempos de Pinochet no Chile dos anos 70, apogeu da Escola de Chicago até a queda do então Ministro da Economia Sergio de Castro. Quando o próprio Pinochet viu o estrago que os Chicago boys causaram, mandou prender o ex-Ministro Castro e reverteu sua política econômica.

A QUESTÃO DO AJUSTE FISCAL

O déficit primário da União e dos Estados no Brasil é causado por dois fatores: o NÃO crescimento que derruba a arrecadação fiscal enquanto as despesas de custeio são constantes e crescentes e os monumentais gastos de vencimentos e de aposentadoria e pensões da elite do funcionalismo dos três poderes, gastos que crescem a taxas muito maiores que os demais custeios do Estado, tomando parcela cada vez maior dos orçamentos.

Nenhuma dessas causas dos déficits fiscais se deve aos pobres. As despesas típicas para essa parte majoritária da população não só não crescem como diminuem na União e nos Estados.

Nas propostas de “ajustes fiscais” os alvos não são as elites do funcionalismo e sim as verbas típicas da pobreza como seguro desemprego, bolsa família, auxílios doença, aposentadoria rural mais as verbas de saúde pública e educação.

Já no conjunto da economia, é a gigantesca despesa de juros da dívida pública o maior dispêndio do custo geral do Estado, seus beneficiários são os bancos e os rentistas, a camada mais alta da população brasileira, que estão nos 30 milhões do grupo de padrão de vida elevado, consolidando a concentração de renda tanto pelos salários e aposentadorias da elite do funcionalismo como pelos rentistas que auferem renda do sistema financeiro.

A AUSÊNCIA DE UM PLANO DE EMERGÊNCIA PARA RECUPERAÇÃO DA RENDA

Sem aumento da renda da massa da população não haverá demanda nova para justificar investimentos na produção de bens e serviços. O novo investimento privado só virá quando a capacidade ociosa, hoje existente na indústria, for ocupada. No setor de cimento, bom para medir a ocupação da indústria, a capacidade não usada é de 60%. As indústrias só investirão quando ocupada toda sua capacidade em um turno e numa segunda fase se partirá pra um segundo ou terceiro turno sem investimento físico. Só quando se esgotar o aproveitamento das linhas usando o mesmo equipamento e instalação e houver indicadores sólidos de maior demanda é que ocorrerão novos investimentos em capital físico e isso hoje está longe de acontecer. Reformas, restabelecimento da confiança e outros indicadores de mercado financeiro não são suficientes como gatilho de crescimento da economia, que irá patinar com pequenas oscilações de índices, comemorados como “início de um novo ciclo”, o que não são. Oscilações milimétricas dentro de uma recessão são a regra, nada é constante em economia, mas isso não indica por si só um novo ciclo de crescimento como a toda hora a mídia econômica faz, com “fake News” sobre novo crescimento inexistente.

UM MODELO ECONÔMICO FRACASSADO

O atual modelo econômico instalado em 1994 com o Plano Real completa 24 anos com um DÉFICIT NOMINAL, isso é o déficit primário mais a conta de juros da dívida pública, de 7,5% do PIB. A dívida pública cresce TODO ANO à razão desse mesmo déficit, já chegando nos 80% do PIB, que por sua vez não cresce há 4 anos. Não há prova maior de fracasso.

Todo o ajuste fiscal apontado, cortando-se o máximo possível de despesas, não resolverá essa equação. Trata-se um modelo inadequado para um País que precisa crescer, não funciona.

O modelo está assentado em um alicerce errado as “metas de inflação” como eixo central de toda a economia, engessando qualquer possibilidade de crescimento natural pelo aumento da demanda. O modelo impede o uso da política monetária para geração de renda que antecede a demanda e esta gera o estímulo ao investimento, sem o aquecimento da demanda não há porque haver crescimento. É a demanda que puxa o investimento e não o contrário.

Para quê construir fábricas se não há demanda porque a população sem renda não tem poder de compra nova. A economia hoje se sustenta pela camada que tem boa situação de emprego e renda, 30 milhões de pessoas, camada que não cresce há anos. A demanda nova teria que vir dos 180 milhões de brasileiros de baixa ou nenhuma renda. Mas não há nenhuma política para esse imenso contingente sair do lodo do desemprego, da desocupação e do desalento.

O ÚNICO CAMINHO DO CRESCIMENTO É A INCLUSÃO DE 180 MILHÕES COMO CONSUMIDORES, FOI ESSE O CAMINHO DO CRESCIMENTO DE 7 e 8% AO ANO DA INDIA E DA CHINA. O PLANO GUEDES NÃO PREVÊ NENHUM PROCESSO NESSA DIREÇÃO.

sábado, 15 de dezembro de 2018

Rumo ao passado

Meu novo artigo:


Antônio Risério, talvez um dos principais antropólogos brasileiros vivos, disse em entrevista que uma autocrítica, coletiva ou individual, é um processo lento, às vezes depressivo, sobretudo muito doloroso, até quando as coisas ficam claras e passamos a compreender os acontecimentos ocorridos e aí tomar novos rumos.

As recentes eleições presidenciais no Brasil foram um desses fenômenos que provocaram uma catarse de ódios e fúrias poucas vezes já vista em nosso País, cujo resultado com a vitória de Jair Bolsonaro, não encerrou o difícil caminho da nação em busca de novos rumos, possivelmente porque ao que tudo indica momentos turbulentos estão por se iniciar.

A eleição do futuro presidente, é bom que se diga, foi legítima. O segundo turno resultou de uma tendência eleitoral que se caracterizou muito mais como plebiscitária.

Cabe aos derrotados reconhecer a vontade da sociedade nas urnas e fazer o que deve ser feito: a oposição determinada e lúcida.

Quando em certos grupos partidários fala-se em “resistência” à vontade das urnas comete-se erro, porque resistência só é legítima contra regimes totalitários que não surgiram da vontade popular sufragada nas urnas.

A oposição deve ser serena, dura ou mesmo implacável, dependendo dos rumos e das ações do futuro governo.

Dentro da absoluta legalidade constitucional, o presidente eleito pode fazer o que acha pertinente, montar a equipe que desejar, indicar as alternativas que melhor lhe aprouver para a sua administração, definir os rumos programáticos do seu governo etc.

Esse é o princípio da Carta Constitucional. Já a Constituição de 1988 é uma sobrevivente, com mutilações, de terremotos políticos de grandes magnitudes desde a sua promulgação.

Não existiu um só presidente da República após 1988 que não tenha sido alvo da tentativa de impedimento. Todos foram. E dois sofreram o impeachment.

Diante desse fato podemos concluir que o Brasil é um vulcão ativo, sempre pronto para entrar em erupção. Portanto, frente a recorrência da exceção no lugar da regra, cabe a investigação da realidade política.

E isso não é nada fácil porque os acontecimentos políticos institucionais deram-se em um espaço de tempo que já percorre trinta anos, desde 1988, e possuem raízes Históricas mais antigas.

A primeira constatação é a de que o País não possui uma noção política constitucional sedimentada, sólida, assentada no espírito do seu próprio destino e interesse nacional. As forças políticas, e quem elas representam, não têm definido em seus propósitos fundamentais, a centralidade da visão nacional.

E as Constituições, ao longo do tempo, revelam essa deficiência, apesar dos reconhecidos e inegáveis méritos dessa última, a de 1988. É a mais grave de todas as nossas vicissitudes.

A segunda constatação decore da primeira, porque se não temos uma sólida cultura política constitucional, sofremos fortes influências de outras culturas políticas, embora o País não possa, em absoluto, se isolar da realidade mundial e suas interfaces em todos os níveis.

Para não recuarmos excessivamente em nossa História como Estado nacional e jovem sociedade, vejamos um período mais recente que moldou a humanidade após a Segunda Guerra Mundial. A chamada Guerra Fria.

Nessa época as forças políticas, as elites, setores acadêmicos, sempre estiveram divididas pelas fraturas impostas na bipolarização mundial, entre o campo socialista, liderado pela União Soviética, e os Estados Unidos.

Tudo que movimentou os conflitos entre nós à essa época, sempre esteve subordinado ao confronto mundial, cuja centralidade residia nos interesses específicos de Estado desses dois gigantes globais da época.

Os interesses internos, a visão de País, a busca efetiva de um projeto nacional encontravam-se em pensadores, economistas, administradores etc., combatidos pelas forças políticas, intelectuais, alinhadas aos dois campos da Guerra Fria.

Em resumo, salvo em períodos excepcionais, o Brasil não pensou estrategicamente o Brasil, moveu-se conforme os projetos geopolíticos das duas grandes potências. Aliás, essa ideia ainda existe entre alguns setores minoritários até hoje.

Com a globalização financeira, a desregulamentação dos fluxos do capital financeiro, especialmente o especulativo, mais uma vez a centralidade da questão dos interesses nacionais está subordinada à nova realidade, no mundo da política, academia, da economia, administração etc., mas os que se movem em busca de um projeto de nação inserido na nova realidade mundial permanecem determinados.

Parte de setores do campo “progressista” assimilaram as chamadas Políticas Identitárias que fraturam e transformam em tribalismo o espírito de coletividade da comunidade nacional. Estão identificados com uma espécie de pensamento ideológico alimentado pelos grandes financistas globais a exemplo de George Soros, e outros.

Enquanto grupos à “direita” alinham-se a uma visão passadista, em nome de um paradoxal nacionalismo associado a um liberalismo econômico financeiro radical.

E uma formulação política, acadêmica, isolacionista que recorre a conceitos quase medievais, de um hipotético passado glorioso, purificado e inexistente, cujos teóricos principais encontram-se, especialmente, nos Estados Unidos.

Temos assim, uma espécie de uma falsa nova Guerra Fria que galvaniza ativistas políticos, acadêmicos, economistas, cuja resultante principal tem sido a ausência de uma visão aprofundada de um projeto do País. Pelo contrário, aumenta a sua distância.

A recente eleição presidencial refletiu esse conflito, que possui dimensão mundial. Trata-se de uma batalha ideológica, teórica, de profundos interesses econômicos, geopolíticos, um diversionismo autoconsciente e uma adesão a subpolíticas que aí estão postas. Invoca a impressão de que ao invés de se caminhar em direção ao futuro, pretende-se mergulhar rumo ao passado. Um evidente escapismo.

Mas os reacionários, diferente de conservadores, são ativistas intrépidos das suas teses quase sempre fundadas no medo apocalíptico do futuro e lutadores das causas purificadoras, nostálgicas, pela volta de um passado que a bem da verdade nunca existiu fora das suas mentes.

Já os outros idealizam, através da análise distorcida da realidade e de um determinismo Histórico, a visão autocentrada nas transformações sociais tal como desejam em suas cabeças.

Tanto uns como outros parecem atualmente empenhados em conduzir as sociedades a um passado glorioso mais que perfeito, que só existe em seus juízos, como se fossem “mentes naufragadas”.

Da crise geral emergiu uma visão nostálgica de tempos já idos, porque é mais fácil fazer um balanço do que já aconteceu, que sobre a complexidade bem mais abrangente do presente.

Melhor seria envidar esforços para compreender e atuar na realidade de um mundo em célere transição.

Onde o papel destacado do Brasil, da sua sociedade, só poderá se concretizar através do esforço, pela vida política democrática, e a união em torno de um projeto factível de desenvolvimento econômico.

Com base na industrialização do País, investimento em ciência e tecnologia, em infraestrutura, educação estratégica em vários níveis, saúde, combate à criminalidade transnacional, defesa das suas riquezas, cultura, possibilitando que o Brasil alcance patamares científicos e civilizacionais à altura dos desafios do século XXI.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Um copo de cólera

Meu novo artigo:


O título do livro Um copo de cólera do escritor brasileiro Raduan Nassar é emblemático para resumir o estado de espírito das sociedades em todo o mundo, com as consequências que sofrem sob os resultados das políticas adotadas pelo establishment.

Ou seja, os repúdios contra governos e partidos políticos que se alternaram sucessivamente durante o período em que predominou, ainda predomina, a globalização financeira, a supremacia absoluta dos grandes especuladores globais que acumularam fortunas de trilhões de dólares em detrimento do crescimento econômico das nações e dos povos.

Pode-se argumentar que alguns partidos fizeram, nessa realidade hegemônica do capital predador, muito mais em favor das maiorias que outros. E é verdade, fizeram sim.

Mas a realidade imposta aos indivíduos tem sido a sistemática queda da qualidade de vida em todos os aspectos que se possa olhar: desemprego, saúde, educação, criminalidade e o que é pior, a perda do sentimento de esperança por dias melhores. E isso acontece a nível global.

Ao invés de se afirmar, a exemplo do Brasil, que forças de conteúdo “obscurantistas”, “profundamente conservadoras”, que ressuscitam velhos fantasmas como a volta do comunismo sob a liderança de uma inexistente internacional marxista, ganharam as eleições, como diria o Conselheiro Acácio, porque a “Direita” avança em todo mundo, seria mais útil fazer um balanço da realidade e dos próprios rumos.

Li um dos livros publicados pelo professor Mark Lilla, ensaísta e titular da Universidade Columbia dos Estados Unidos. Mark é, além do mais, engajado nas causas progressistas, tem posição e lado definido.

Ele faz uma retrospectiva da luta de ideias nas últimas décadas da política norte-americana, e quando se lê o seu livro, a sensação que se tem é que ele poderia ser usado para a situação do Brasil, com as modificações das distintas realidades entre os dois Países.

Sobre hegemonia política Mark lembra a observação de Abraham Lincoln: “o sentimento público é tudo. Com ele, nada fracassa; contra ele, nada dá resultado. Quem molda o sentimento público vai mais fundo do que quem promulga leis ou profere decisões judiciais”.

Mark Lilla diz que a vitória de Trump “é uma mistura de verdades, meias verdades, mentiras, teorias da conspiração, invencionices, num caldo tóxico engolido com vontade pelos crédulos, indignados, e pelos perigosos”.

A crise da economia global promovida pelo capital especulativo é tão brutal que o que nós estamos assistindo pelo mundo é a assertiva da frase emblemática de Lincoln. Quem está moldando a cólera da opinião pública tem sido a fórmula com que o autor define Trump. A pergunta é, por que?

Uma das respostas de Mark é que os partidos ditos progressistas se cercaram, como referência teórica central, das agendas de Políticas Indentitárias desde os anos oitenta nos EUA. E depois, pelo mundo.

Abandonaram a ideia e a visão central da nação, do sentimento de solidariedade, do espírito da oportunidade para todos e do dever público. Envolveram-se nessa Agenda Identitária, perdendo o sentido do que compartilhamos como cidadãos e do que nos une como nação.

Nos anos sessenta e setenta, a luta pelos Direitos significava a batalha de grandes grupos de pessoas em defesa dos direitos das mulheres, contra o racismo, pelo reconhecimento efetivo das minorias, que tinha a simpatia e adesão entusiasmada das grandes maiorias.

Mas nos anos oitenta, nos EUA, essa política cedera lugar a uma pseudopolítica de autoestima e de autodefinição cada vez mais estreita e excludente, promovendo sucessivas fragmentações internas, visões tribais e a condenação das grandes maiorias que não pertenciam a essas especificidades, que seriam responsáveis pelas alegadas injustiças Históricas, fazendo voltar-se a juventude para a própria interioridade e praticamente condenando o mundo exterior não pertencente aos grupos indentitários.

Isso deixou os jovens despreparados para pensar no bem comum, que é fundamental para assegurar todos os direitos, e na tarefa política nada glamorosa de persuadir a todos em participarem de um esforço comum para o bem da coletividade, da nação.

O identitarismo passou a ser visto, pelas grandes maiorias sociais, como uma “doutrina” professada basicamente por determinados setores das elites urbanas instruídas sem contato com o resto do País, cujos esforços se resumem em zelar e alimentar movimentos hipersensíveis, que dissipam em vez de concentrar as energias da sociedade como um todo.

De outro lado, o identitarismo ao contrário de negar as agendas do neoliberalismo econômico radical reforça-o, porque reduz o espírito de comunidade nacional ao indivíduo, ao grupo. Em consequência, afirma Mark, o identitarismo deixou de ter projeto político relevante e se metamorfoseou num programa de evangelização.

Mas a diferença, diz Mark, é que evangelizar é dizer “verdades” ao poder. Fazer política é conquistar o poder para defender as verdades.

Assim, e por várias outras razões, os cidadãos se sentem abandonados por esses partidos políticos que não respondem ou não propõem alternativas básicas, reais, concretas, assimiláveis, às sociedades que naufragam em uma violenta crise econômica, social. Quer dizer, não os representam.

Porém, afirma Mark, não existe antes em política, só o depois. O que nós estamos vendo nos Estados Unidos, nos levantes populares na França, na Itália, no crescimento parlamentar do grupo VOX na Espanha, na recente eleição no Brasil, Grã Bretanha, e tudo indica, vem muito mais por aí, são imensas revoltas sociais contra as consequências das políticas da globalização financeira, a miséria crescente, a insegurança brutal com o amanhã, a criminalidade crescente, o desemprego, a desesperança. Enfim, é o copo de cólera transbordando.

Ou as forças políticas lúcidas substituem a linha das Políticas Indentitárias como eixo central programático, oficial ou oficioso, ou as sociedades vão abraçar “as verdades, meias verdades, mentiras, invencionices, teorias da conspiração, o caldo tóxico que atrai os crédulos, os indignados”. E os “perigosos” vão liderar os clamores das sociedades.

De nada adianta afirmar, como no Brasil, que os “obscurantistas”, os “conservadores” estão vencendo, diria o Conselheiro Acácio, porque há uma onda de “Direita” no mundo. Ou mais grave “o povo não sabe votar”, “é atrasado e conservador”. isso é errático, uma fuga da realidade. E o que é pior, de nada adianta.

“Eles” estão crescendo porque estão dizendo “suas verdades, meias verdades, mentiras, invencionices, teorias da conspiração” e falando à alma, o coração das sociedades.

Enquanto os demais se “refugiam nas cavernas das suas autossatisfações das Políticas Identitárias” proclamando-se “moralmente superiores”, isolando-se das sociedades que clamam por soluções urgentes e abrangentes.

É pertinente acreditar firmemente na capacidade de unir as amplas maiorias em torno do bem comum, das grandes soluções sociais, inclusas todas as minorias, na defesa dos interesses nacionais, no desenvolvimento que abrigue as aspirações da sociedade, na defesa da nação, da sua identidade cultural, na convivência entre os povos.

Mas para isso é fundamental a vontade crítica de reunir um conjunto de propostas que unifique o espírito coletivo, individual, que atinja os corações e as mentes das sociedades e, em nosso caso, do povo brasileiro.

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

Demônios da carnificina

Meu novo artigo:


As grandes conflagrações de massas que estão acontecendo por várias partes do mundo, como os violentos conflitos sociais atuais na França, indicam o esgotamento da Ordem Mundial vigente, com o agravamento da crise financeira iniciada em 2008, antecedida pela hegemonia unipolar norte-americana, após a extinção da antiga União Soviética, ao final da década de noventa.

A História pode não se repetir, mas os acontecimentos, às vezes, se parecem em muitos aspectos.

As crises geopolíticas, a grande depressão econômica, que antecederam às duas grandes guerras mundiais em 1914 e 1939, mostram que os fatores econômicos e a panela de pressão que tamponam a necessidade de novos rearranjos no teatro das nações, em virtude de realidades emergentes, podem impulsionar os Países e as sociedades no rumo de conflitos perigosos ou até militares de proporções catastróficas.

A atual Ordem Mundial surgiu com base na total desregulamentação dos fluxos dos capitais financeiros, especialmente especulativos e predadores, provocando o estancamento da economia global com as suas consequências, tais como o refluxo das economias produtivas, que passaram a crescer a níveis mínimos ou ridículos, quando não negativos.

Daí cresce a crise social, a queda na produção industrial que aumenta enormemente o desemprego, a informalidade no trabalho. O crime organizado torna-se um setor econômico cada vez mais dinâmico e poderoso, especialmente o narcotráfico.

Ele associa o seu processo de acumulação de fortunas à lavagem do dinheiro em paraísos fiscais e absorve também considerável parcela da mão de obra dos assalariados dispensados, especialmente as populações das periferias, abandonados à própria sorte.

Para a solução dessa monumental crise multilateral, o liberalismo econômico radical indica a redução do papel dos Estados em áreas estratégicas e o famoso ajuste fiscal. E se as medidas tomadas não derem certo, a saída será mais ajustes fiscais e venda de patrimônios estatais, naturais, e assim infinitamente. Essa é a lógica da escola neoliberal de Chicago.

A de que o mercado tudo resolve e o Estado só atrapalha. Mas a verdade é que em canto algum do mundo isso comprovou-se verdadeiro.

O Estado tem papel central como indutor, regulador e promotor do desenvolvimento econômico, inclusive nos Estados Unidos durante a crise de 2008, que salvou os superbancos americanos na época e em consequência, a indústria e a própria economia norte-americana de uma catástrofe generalizada, embora a sua sociedade ainda sofra dos efeitos dessa crise até hoje.

Mais que uma fórmula dogmática, o neoliberalismo, e suas variadas denominações, representam uma ideologia sem bases na análise da realidade, que além de não enfrentar as consequências de uma crise econômica, leva ao seu agravamento.

Por outro lado, e em paralelo, para justificar o novo status gerado pela crise nas sociedades, o capital financeiro invoca novas teses como as Agendas Identitárias e do Politicamente Correto, com o objetivo de fragmentar, tribalizar e atomizar o tecido social, aumentando a desorientação que já é generalizada.

Além do mais, com a crise social atingindo enorme escala, setores da sociedade ficam reféns de alternativas políticas autoritárias internas e isolacionistas na política externa.

Assim, assistimos hoje a uma contenda entre neoliberais multiculturalistas versus neoliberais antimulticulturalistas como falsas alternativas a uma crise global sem precedentes na economia.

Obstaculizam a vida política, essencial aos rumos das nações, por um conflito ideologizado, enrijecido, intolerante, distante das propostas e alternativas às sociedades e aos Países.

Exatamente como no período que antecedeu às duas guerras mundiais, hoje parte das grandes potências do planeta refluem para uma linha econômica e geopolítica isolacionista, vejam os EUA, tratando de, na defensiva, assegurar a hegemonia global.

Essa estratégia levou à sanguinolenta primeira guerra mundial e lançou as bases para a brutal carnificina que foi a segunda guerra mundial.

O outro fator importante é a negativa, da parte das grandes potências, em reconhecer a reconfiguração da geopolítica global com o surgimento de novos atores mundiais a exemplo dos BRICS.

É uma fixação da ideia do domínio incontestável e imutável de uma hegemonia anglo-americana, desconhecendo, portanto, uma realidade em curso e em evolução, que pode beneficiar todos os Países, inclusive a essas mesmas potências atuais.

Para sustentar suas premissas ressuscitam-se velhos fantasmas, buscam atrair para as suas áreas de influências parceiros sob argumentos ideológicos e alguns até místicos.

É preciso que os Países construam alternativas à supremacia do capital especulativo predador, definam novas linhas partilhadas, cooperadas, de desenvolvimento econômico, defendam uma geopolítica global multilateral, o direito à autodeterminação das nações e das suas riquezas. Porque o mundo dá sinais de rápida deterioração das soberanias nacionais, das liberdades democráticas e individuais.

O perigo atual não são os velhos fantasmas que saem das catacumbas, mas os Demônios das Carnificinas que resultaram nas guerras mundiais de 1914 e em 1939 com centenas de milhões de mortos e mutilados. O Brasil precisa defender o seu protagonismo econômico e geopolítico regional. Propositivo, cooperativo e rejeitar qualquer política externa xenófoba, isolacionista.

segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

Rumos de uma política externa, por André Araújo




Política externa parte de sinais indicativos que um novo governo apresenta ao mundo. Nesse sentido, e muito antes que necessário, o novo governo a se instalar em Janeiro aponta rumos que produzirão consequências previsíveis. Quais são elas:

1. Afastamento do Brasil das históricas boas relações com a ARGENTINA, que vem sem maiores tropeços desde os anos 50, culminaram com o Acordo do Mercosul entre os Presidentes Alfonsin e Sarney, tão importante que os passaportes dos quatro participantes têm no topo da capa o nome MERCOSUL.

As economias do Brasil e Argentina estão razoavelmente integradas com montadoras de automóveis no Brasil dimensionadas em função do Mercosul.

2. Congelamento das relações do Brasil com a UNIÃO EUROPEIA pela negação dos acordos climáticos, de transcendental importância no contexto europeu.

Essa movimentação trará evidentes barreiras às exportações brasileiras, especialmente de proteína animal, que já são difíceis para esse grande mercado.

3. Distanciamento que poderá levar ao rompimento da aliança do Brasil com o GRUPO BRICS, constituído pelos grandes países que se contrapõem à política externa dos Estados Unidos. O Brasil é fundador e dá a primeira letra do bloco, um desligamento significará uma diminuição evidente da importância do País.

A adesão incondicional do Brasil à política externa americana é uma negação da própria razão do BRICS e o Brasil perde a lógica de estar no grupo.

4. Uma óbvia ruptura com o MUNDO ÁRABE em função de uma aproximação desnecessária com a política externa israelense, colocando em risco vários interesses do Brasil conquistados na região desde o Governo Geisel, quando o Iraque salvou o Brasil com fornecimento de petróleo a crédito, recebedo em produtos brasileiros e obras executadas pela engenharia brasileira. Um capital político de 40 anos colocado em risco real, as exportações de proteína animal do Brasil para o mundo árabe garantem, por baixo, 160.000 empregos no Brasil. Os árabes são emocionais e costumam reagir ao que consideram ofensas.

5. Finalmente, adesão indiscriminada e incondicional da política externa brasileira à Washington, NÃO COM OS EUA como País e sim com o PRESIDENTE TRUMP, é uma adesão ideológica aos que consideram serem as teses anti-globalistas e fundamentalistas desse Presidente que vêem como companheiro.

Trump já caminha pela segunda metade do mandato e a cada dia suas chances de reeleição diminuem. As investigações do Promotor independente Robert Mueller avançam e agora descobre-se que a Organização Trump, antes da eleição do atual Presidente, propos ao Presidente da Rússia, Putin, a construção de uma Trump Tower de apartamentos de luxo em Moscou. Por tal projeto Trump foi várias vezes a Moscou, assim como o filho, seu genro e filha. Putin deveria fornecer o terreno, as licenças e o financiamento e receberia de presente um apartamento de 50 milhões de dólares na torre.

Este caso está na mídia americana deste o início da semana em grandes matérias de jornais e noticiários de TVs. Mais desgaste para um Trump atacado.

No próprio Partido Republicano, o capital político de Trump está em queda livre, especialmente após a derrota nas eleições para a Câmara.

Atrelar a política externa brasileira gratuitamente a esse personagem significa que haverá um reverso se um Presidente do Partido Democrata for eleito em 2020, quando o Governo Bolsonaro ainda terá 2 anos à frente. A política externa da Presidência Trump é considerada um grave desvio até por grande número de Republicanos, o Brasil está se vinculando a essa política cujo fracasso é apontado pela elite política e empresarial americana. A política externa de Trump tem oposição quase total no Departamento de Estado e no "establishment" de relações exteriores dos Estados Unidos.

Mais ainda, não há segurança alguma de que o Governo Trump dê valor a essa adesão gratuita do Brasil. A Colômbia foi eleita pelo Governo Trump como parceiro preferencial dos EUA na América do Sul. Nenhum gesto do Presidente Trump demonstrou maior crédito a essa adesão, se o Brasil não atender ao que os EUA quer que o Brasil faça na Venezuela, de nada valerá a submissão do Brasil. Americanos são frios e objetivos, não se comovem por amizade.

Uma política externa de um grande País não pode se atrelar ao Presidente de outro País. Isso nunca aconteceu na diplomacia brasileira, que sempre preservou sua capacidade de manobra no complicado contexto da geopolítica mundial porque o interesse de uma semana pode ser outro na semana seguinte. E mesmo entre aliados há divergências em temas, não existe aliança incondicional em política externa, nem em tempos de guerra.

O caminho que se aponta para a política externa brasileira pode ser o caminho do abismo para os interesses geopolíticos brasileiros a longo prazo, levando o Brasil a um inédito isolamento diplomático que trará evidentes reflexos na economia e na visão sobre o País no mundo.

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Trinta anos da Constituição

Meu novo artigo:


A minha geração, que é a dos anos sessenta e dos anos setenta, que lutou contra o regime autoritário de 1964 a 1985, sempre teve como objetivo o combate político através de três bandeiras: a luta pelas mais amplas liberdades democráticas, a defesa dos direitos dos trabalhadores, a defesa da nação, a defesa do Brasil. Portanto, uma geração de democratas e patriotas. Pelo menos em sua maioria.

Daí a consagração do SUS na Constituição com a premissa: “a saúde é um direito de todos os cidadãos e um dever do Estado”. Como cláusula pétrea.

Trata-se como modelo de saúde pública, do mais amplo do mundo em vigência. Seja pela sua abrangência, como pela população hoje por ela beneficiada, mais de 200 milhões de irmãos brasileiros.

Vivemos três grandes momentos vitoriosos que mobilizaram dezenas de milhões de brasileiros: a campanha pela anistia ampla, geral e irrestrita, a defesa das eleições diretas para presidente da República e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, que conferisse ao País uma nova Constituição em um regime de amplas garantias democráticas.

Assim, o processo constituinte mobilizou milhões de pessoas que em seus Estados ou em caravanas à Brasília, participaram ativamente com propostas para a elaboração da Carta magna do País.

Nós podemos concluir que toda Constituição é feita por mulheres e homens, e que as Constituições são produto de uma determinada época Histórica.

Portanto, elas guardam em si as virtudes e as imperfeições das sociedades. A nossa Constituição surgiu depois de um período autoritário.

Nesse sentido podemos afirmar que o seu traço característico foi uma espécie de um “porre de cidadania”, de direitos individuas e sociais que estavam subtraídos desde um longo tempo.

Faltou-nos delinear, e aqui falo pessoalmente, as linhas gerais de um projeto de nação para o futuro. E isso nos fez, e continua fazendo, muita falta. Especialmente no atual período turbulento que vive o Brasil e a humanidade.

A Constituição dos Estados Unidos, por exemplo, foi, nesse aspecto, eficaz: consagrou os direitos individuais e demarcou, em linhas gerais, o Espírito de identidade de uma Comunidade Nacional na, hoje, poderosa nação do Norte.

Assistimos, na recente campanha presidencial, a defesa da convocação de uma Nova Constituinte, exclusiva ou não. De todos os lados, de vários candidatos. Felizmente todos desistiram dessa empreitada.

Porque as Constituições não são plataformas de programas e campanhas partidárias. Elas não fazem parte de contextos conjunturais na vida de um povo.

As Constituições acontecem em situações Históricas muito particulares, como um ponto fora da curva, quando se esgota um determinado período Histórico e surge outro em seu lugar, necessitando de novas normas que orientem e disciplinem a nação.

Além do mais as Constituições exigem, para a sua legitimidade, um grande pacto social, aceito por toda a comunidade nacional, e por ela respeitada com naturalidade. Sem isso é impossível a sobrevivência de uma Constituição.

Assim, celebramos e defendemos com determinação os 30 anos do SUS e da nossa Constituição.

Sempre lembrando que só existe Estado de Direito se houver a indeclinável legalidade democrática. E só existe legalidade democrática, se houver legalidade constitucional, o respeito irrestrito à Constituição.

quinta-feira, 22 de novembro de 2018

A Política é quem comanda

Meu novo artigo:


O mundo vive uma época de convulsões, de rupturas políticas em várias latitudes que vêm se acentuando rapidamente nesses últimos anos. A base desses cataclismos reside em uma crise financeira, econômica global, de grande magnitude, muito mais que mudanças culturais, comportamentais ou ideológicas que são alardeadas como o centro do que presenciamos.

Dito de outra maneira a crise financeira global, iniciada em 2008, é o centro das encruzilhadas de rumos com que se deparam as nações nas primeiras décadas do século XXI.

Nas condições atuais de uma espetacular concentração, centralização do capital financeiro, especialmente o especulador e parasitário que não investe na produção, a contínua queda do crescimento econômico para escalas ridículas, ou mesmo nulas, a debacle da economia dos Países tem sido brutal.

Em consequência, passamos a viver uma era de profundas incertezas nas sociedades e nos indivíduos. Essa é, na verdade, a mãe de todas as crises humanitárias na segunda década do novo milênio.

Nessas circunstâncias, quem primeiro é atingido é a produção, o crescimento econômico, o desenvolvimento das nações, em consequência a precarização do trabalho, o desemprego em massa, a subutilização da capacidade dos investimentos na formação da mão de obra etc.

Quando afirmam que um aplicativo qualquer proporciona a quem tem um carro poder ter uma oportunidade no mercado, usando-o como uma nova forma de táxi, mesmo que o proprietário possua formação técnica ou superior, é no mínimo uma brincadeira de mau gosto, ou um esbulho para com as necessidades de força de trabalho de uma sociedade sob o falso manto das novidades implementadas pelas novas tecnologias. É desemprego disfarçado!!

Mas as pessoas se acostumam a tudo, mesmo sofrendo, com as justificativas “teóricas” e midiáticas sobre os “novos tempos”, a “quarta revolução industrial”, mesmo verdadeira. A necessidade da sobrevivência a qualquer custo, na lei da selva, se impõe a fórceps.

Não há desenvolvimento científico, tecnológico, justificável sem a contrapartida humana. O que estamos vivendo é uma mentira deslavada imposta às sociedades. Não acreditem nessa farsa.

O que está em curso é a brutal desumanização do indivíduo, transformado unicamente em consumidor de tecnologias, desprovido de direitos elementares que cada vez mais lhes são subtraídos em plena luz do dia sob argumentos de redução dos gastos supérfluos. O que existe é a contínua concentração do capital especulativo, a redução dos custos em investimentos e em mão de obra.

A diretriz econômica é definida pela estratégia política hegemônica. E essa hegemonia política hoje é ditada pelo Mercado financeiro em escala global. Na sua esteira há os ideólogos que passam a “justificar”, ou até enaltecer, a realidade como um passo a frente na escala da sociedade. Com o apoio da grande mídia hegemônica associada às diretrizes desse próprio “Mercado”.

Para fomentar a desunião impõe-se uma agenda global diversionista, mesmo que auto justificável em vários aspectos, onde o conjunto da sociedade é pautada por disputas atomizadas, fragmentárias em escalas ad infinitum em suas subdivisões. As chamadas Agendas Identitárias.

Assim, as energias são gastas em lutas e ódios internos sistemáticos, enquanto prossegue a estratosférica acumulação do capital financeiro, a pauperização das sociedades raras vezes presenciada nesse nível de grandeza.

A dita fórmula da liberalização radical e inevitável da economia nada mais é, no geral, que a apropriação deliberada dos bens sociais e estatais comuns de uma nação, um povo, a serviço de megacorporações internacionais de setores estratégicos e das finanças especulativas globais.

Vivemos uma era da alienação material e mental das sociedades em escala jamais vista na História humana. Alienação das riquezas, cultural, espiritual, das identidades dos povos, alienação do trabalho, alienação do futuro, e a apologia do presente contínuo.

O que se pretende pela via do capital financeiro, do Mercado, é que o mundo da política cuide dessa tarefa impossível. Associar a imprescindível vida política que rege e orienta as sociedades, com os mecanismos alienantes impostos. Daí a crescente perda de substância e credibilidade da via política que vai sendo nivelada pelo mais tosco pragmatismo.

É por isso que afirmam, com razão, que a democracia e a globalização do rentismo predador são incompatíveis, já que a segunda tende a anular ou destruir a primeira. É só uma questão de tempo.

As soluções autoritárias começam a ser uma coisa “natural”. Mas nada disso é natural, é uma imposição brutal aos povos, às nações, às sociedades. As saídas totalitárias são as formas superiores de alienação humana, coletiva e individual.

Estamos presenciando uma crise econômica, financeira, civilizacional descomunal, catastrófica, promovida pela política da globalização do capital especulativo, das megacorporações mundiais.

As alternativas a esse cenário dramático só poderão acontecer pela via de novas orientações e um novo rumo da Política, porque é a política quem sempre está no comando das decisões na História das sociedades.

Em uma encruzilhada dessa magnitude é fundamental a necessidade de novas formulações e rumos que ajudem aos povos a construir alternativas que sejam favoráveis ao amplo desenvolvimento econômico, o progresso construtivo às nações, às sociedades e aos indivíduos.

domingo, 18 de novembro de 2018

Mundo em rupturas

Meu novo artigo:


As eleições presidenciais no Brasil são uma consequência de um processo de rupturas em sequência que estão ocorrendo em escala mundial, que decorre da saturação das políticas sob a hegemonia do capital financeiro global, cuja resultante principal tem sido o prolongado e pífio crescimento econômico em todos os quadrantes do planeta, salvo as exceções conhecidas como a China.

O crescimento nulo, associado a um processo de degradação, combinado a estágios de recessão, tem levado a uma crise social extremamente profunda das sociedades, combinando elevados índices de desemprego, avanço da criminalidade, marginalidade, informalidade, com a intensificação do sentimento de insegurança dos indivíduos, que se espraia pelas comunidades nacionais sem qualquer dúvida.

Essa crise atual da globalização financeira vai revelando aos povos a situação da precariedade no conjunto das sociedades e as cifras astronômicas de lucros que aufere o capital especulativo predador.

No fundo isso representa a estagnação das economias e as contínuas levas de centenas de milhões de desempregados. É essa centralização do capital em mega corporações especulativas globais que também tem sido a força econômica, política, difusora de ideologias e comportamentos em escala mundial.

Por isso a sensação de raiva, insubordinação das pessoas, que tem como pano de fundo as incertezas com o futuro, não só ao longo prazo, mas no imediato das suas vidas e dos seus próximos.

A guerra cultural travada no Brasil, e em grande parte do mundo, decorre do fato de que para essas pessoas a globalização financeira não só tem sido responsável pela atual crise econômica como vem sendo a promotora das políticas institucionais, culturais, comportamentais em vigor nas sociedades e que lhes são adversas.

Paradoxalmente as esquerdas sempre foram vistas como referências antissistema, mas as Políticas Indentitárias que foram impulsionadas no século XXI através dos ideólogos da mundialização financeira, foram abraçadas por forças partidárias da chamada “esquerda”, daí a identificação de várias dessas organizações com o establishment repudiado.

Por outro lado, a democracia liberal clássica não é compatível com a lógica hegemônica e expansionista do capital financeiro. Esse é um dos grandes confrontos que vamos presenciar em uma escala cada vez mais dramática.

Como já se disse, o capitalismo neoliberal vem deixando em sua esteira uma multidão de sujeitos destruídos, inclusive no Brasil, muitos dos quais estão profundamente convencidos de que o seu futuro imediato será uma exposição contínua à violência e à ameaça existencial.

Assim, eles anseiam genuinamente um retorno a certo sentimento de certezas e ordem já que as nações se transformaram, pelas consequências da globalização financeira, em algo como pântanos que precisam ser drenados e o mundo como se encontra já não pode continuar, deve ser levado ao fim. Esse é o estado de espírito que vai se transformando em majoritário, afirma Achille Mbembe.

Longe de arrefecer, a luta política assumirá contornos de confrontos de rua e extremante polarizada. Onde a luta social contra as consequências econômicas e culturais promovidas pela globalização financeira vão crescer substancialmente.

O que estamos vendo é uma tendência de rupturas políticas contra a sociedade moldada pela financeirização mundial do capital especulativo e suas resultantes econômicas, sociais, políticas, comportamentais.

Essas insubordinações, em geral, não têm critérios programáticos, são carregadas de revoltas e emocionalismos difusos, de caráter imprevisível. A outra questão é que as categorias políticas da época da Guerra Fria, da bipolarização ideológica global dela oriunda, já não mais respondem às interpretações desses novos tempos dramáticos. Simplesmente porque tudo mudou e caminhamos de forma acelerada para uma realidade geopolítica multipolar.

Cresce, pela ótica dos povos, o anseio por outra Ordem Mundial que lhes seja mais favorável, menos injusta, não de brutal exploração. Tudo pode acontecer porque as disputas políticas estão em aberto.

Assim, importa ao Brasil a defesa intransigente dos valores democráticos, da legalidade constitucional, a luta pelas conquistas dos trabalhadores, a batalha, na Nova Ordem Global em transição, pela soberania nacional. O desenvolvimento econômico, os seus legítimos interesses, o protagonismo e a liderança geopolítica de nação continental estratégica, no teatro global das nações que vai se reconfigurando.

terça-feira, 13 de novembro de 2018

A Economia Política da Recessão, por André Araújo




É um caso de estudo o jornalismo econômico brasileiro que considera que a economia de um grande País começa e acaba na cotação do dólar e no índice da Bolsa, já a economia da produção, aquela que dá empregos, produz a comida, realiza o transporte e a arrecadação simplesmente não interessa, MAS NO MUNDO DA REALIDADE É A ÚNICA QUE IMPORTA.

Os comentaristas econômicos começam e acabam seus programas com as cotações do dólar e do índice da Bovespa, é nível de jardim de infância, sua ancoragem é no “mercado” financeiro.

Alan Greenspan, o “maestro” do Federal Reserve, passava horas na banheira examinando estatísticas de produção, seu gancho favorito era o número de “telhados” contratados, porque isso indicava o ritmo da indústria de construção, vital para o emprego, também interessava a produção semanal de aço e mais centenas de indicadores da economia real que serviam como termômetro do grande economista, praticante da economia como arte e não servo de planilhas e cartilhas, por isso o nome dado a ele (e título de sua biografia) de “MAESTRO”, um maestro de orquestra coordena os instrumentos pelo gesto usando sua sensibilidade, experiência, cultura, os grandes maestros nem precisam de partitura, basta-lhes o ouvido.

Os economistas de mercado brasileiros são escravos de fórmulas prontas e delas não saem.

Têm como eixo poucos indicadores, girando entre câmbio, bolsa e juros, aí acaba a economia.

Em recente programa o palestrante-economista Ricardo Amorim disse que será ótimo se o novo governo baixar as tarifas de importação porque aí os produtos importados iriam ficar mais baratos e isso faria com que baixem os índices de inflação e com isso, ora vejam, as taxas de juros vão cair e aí, disse triunfante, o investidor estrangeiro virá porque os juros baixam, o que agride a lógica, mas em sendo verdade é um roteiro para anos, enquanto isso os desempregados não têm almoço, além do que com a baixa de tarifas importa-se mais e a indústria nacional vende menos, portanto mais desemprego e menos crescimento.

Esse tipo de raciocínio é o kit básico dos “economistas de mercado” brasileiros.

O raciocínio dessa gente agride o bom senso mais elementar, o primeiro problema que um novo governo tem que enfrentar é gerar renda de imediato para a população poder comprar e reativar a economia e fazê-la crescer, os ajustes e reformas podem começar junto mas tanto um como outras só produzem resultados a longo prazo. Todos esses raciocínios toscos se constroem sob mitos, chavões, bordões e mantras que a mídia se encarrega de espalhar, nascem da mediocridade espantosa dos economistas neoliberais brasileiros e se propagam pelas redes de comunicação como se fossem verdades reveladas, coisa de sábios iniciados.

MITO DA DÍVIDA PÚBLICA

A dívida pública federal do Brasil é grande, mas não é desproporcional ao PIB, está abaixo da maioria dos países ricos e dos países emergentes, tampouco é um grave problema imediato e tampouco será resolvido sequer a médio prazo, não deve ser um eixo de toda a apolítica econômica, não está havendo nenhum problema de rolagem da dívida, porque ao contrário do que propagam os economistas de mercado, TÍTULO FEDERAL não é um investimento para a maioria dos detentores desses papeis, rende pouco, mas vale a LIQUIDEZ, é o dinheiro parado esperando outro destino, NÃO existe outra alternativa para guardar dinheiro nessa escala a não ser títulos federais de liquidez imediata e que ainda pagam juros, em muitos países, como o Japão NÃO se paga juros para guardar dinheiro dos bancos e corporações.

A dívida pública em moeda nacional de um grande País não é um problema, em último caso o Estado pode resgatá-la emitindo moeda, a dívida pública deve ser administrada e usada como instrumento de política monetária, mas torná-la um eixo determinante de política econômica é coisa de economista medíocre, é o ultimo dos problemas econômicos atuais do Brasil, um problema que está aí há muitos anos e não vai acabar nem em décadas, não há urgência alguma enquanto questão para a economia, deve ser resolvido a longo prazo, não tem precedência sobre a crise imediata do desemprego que coloca em risco toda a economia.

MITO DO AJUSTE FISCAL

Variante do mito anterior, a maioria dos grandes países tem déficit fiscal, alguns por décadas, é uma anomalia que deve ser tratada, mas o ajuste leva tempo e exige cuidado, não pode ser tratado como se fosse um incêndio a apagar, o déficit fiscal brasileiro não é novidade na nossa história econômica, O DÉFICIT NÃO É CAUSA DA RECESSÃO, é sim causa de um desequilíbrio que precisa ser tratado NÃO SÓ PELO LADO DO GASTO mas também pelo lado da arrecadação e esta depende do crescimento, que exige expansão monetária e não contração como se faz hoje, com baixo crescimento o DÉFICIT AUMENTA porque a maior parte do gasto é inflexível, é mais racional fazer o ajuste pelo lado positivo, do crescimento E NÃO DO CORTE.

O déficit fiscal, assim como a dívida pública NÃO pode ser o eixo central de uma política econômica, esse deve ser o EMPREGO e o CRESCIMENTO, objetivos que podem perfeitamente conviver com dívida pública elevada, a do Brasil não é tão elevada em relação ao PIB.

Mais ainda, tratar do déficit com ajuste fiscal rigoroso CAUSA MAIS RECESSÃO, CAI A ARRECADAÇÃO E PORTANTO GERA MAIS DÉFICIT, um círculo vicioso, enquanto o crescimento faz aumentar a arrecadação dando tempo para o corte que deve ser feito nos desperdícios enormes que existem na administração pública, corte gerado por eficiência e não linear.

O déficit fiscal de agora só existe porque o PAÍS NÃO CRESCEU, se um crescimento de 2 a 3% do PIB tivesse sido mantido desde o início do programa recessivo de Joaquim Levy, o primeiro dos economistas de mercado que deu início à recessão em 2014, NÃO HAVERIA HOJE DÉFICIT FISCAL porque a arrecadação teria crescido em 4 anos muito mais que o atual déficit de 2018.

Foi a QUEDA DA ARRECADAÇÃO causada pela recessão que gerou o déficit fiscal, não o aumento das despesas, embora essas devam ser racionalizadas, há muito desperdício na despesa pública de modo geral, em todas as esferas de poder, para cortar precisa tempo, programas racionais de eficiência, simbolismo de austeridade no topo do governo.

O MITO DA CONFIANÇA

Dizem os economistas de mercado que é preciso criar confiança para o investidor estrangeiro trazer recursos para investir no Brasil e com isso a economia crescer. É um clichê de baixa categoria, o Brasil teve mega investimento estrangeiro em PRODUÇÃO, investimento de longo prazo e não especulativo, em tempos de ALTA INFLAÇÃO E DÉFICIT FISCAL, a confiança que o investidor precisa é de EXISTIR DEMANDA para seus produtos, com isso justifica o investimento, foi em tempos de crise aguda, com alta inflação e desequilíbrio cambial e crise econômica contínua que a Volkswagen chegou a empregar 44.000 operários no Brasil, estava tudo ruim na economia brasileira MAS HAVIA MERCADO para os carros Volkswagen, o investimento foi gigantesco e HAVIA CONTROLE DE CÂMBIO para remessa de lucros, nada disso abalou Volkswagen, Mercedes, Goodyear, Pirelli, Abott, Unilever, todas com grandes filiais no Brasil porque HAVIA MERCADO, essa era a confiança e não déficit fiscal e dívida pública que nunca assustou investidor nacional ou estrangeiro, isso é papo de “economista do mercado especulativo” e não de economista da grande política econômica de País.

E, no entanto, esse mito continua sendo propagado pelos comentaristas econômicos que repetem como papagaios, “é preciso restabelecer a confiança, etc. etc. etc.,” sempre a mesma conversa fiada, tola, de gente que aprende em apostilas e não entende nada de história, de história da economia, de história do pensamento econômico, repetem como papagaios bordões propagados pelo mercado especulativo, que são suas únicas fontes de informação.

MITO DAS RESERVAS DO BANCO CENTRAL

O Brasil NÃO tem reservas cambiais em excesso em comparação com outros países emergentes. A Rússia e a Coreia do Sul têm PIBs menores do que o Brasil e têm reservas maiores que o Brasil, a Rússia tem US$460 bilhões e a Coreia do Sul US$403 bilhões, com PIBs em torno de US$1,5 trilhão cada. As reservas cambiais são o capital de giro do comércio exterior e garantia para o endividamento em moeda estrangeira, que no caso do Brasil é de US$450 bilhões, incluindo dívida pública e privada, as reservas NÃO SÃO EXCESSIVAS, 18% do PIB não é reserva em excesso sob os critérios do BIS.

As reservas cambiais são essenciais como lastro de toda a economia, não existe nenhuma lógica em dissipá-las para qualquer fim, muito menos para pagar dívida pública em moeda nacional, uma insensatez absoluta, a dívida em Reais pode ser paga em Reais sempre.

Além do que há um obstáculo técnico, as reservas são do BANCO CENTRAL e a dívida pública é da União, são dois entes juridicamente distintos, com contabilidades próprias, o Banco Central deve obedecer a certas convenções com o Banco de Liquidações Internacionais, o Banco da Basileia, que é o banco central dos bancos centrais, a União NÃO pode dispor como se dela fossem das reservas cambiais do Banco Central que tem como contrapartida o PASSIVO dos depósitos compulsórios que pertencem a todos os agentes econômicos, tem dono.

Outra consequência é que a venda de dólares das reservas para obter Reais jogará para baixo a cotação do dólar, com enormes prejuízos para o próprio Banco Central. Para obter Reais, o Banco Central não precisa vender dólares, basta emitir moeda, que é sua prerrogativa.

MITO DO INVESTIDOR ESTRANGEIRO

Um personagem inventado pela mídia como sendo o eixo do crescimento. Na realidade esse “investidor estrangeiro” NÃO é a empresa industrial ou produtora de bens e serviços, é o fundo especulativo que entra e sai da Bolsa, cujo efeito sobre o crescimento é zero.

Mesmo em se tratando do investidor na produção, sua contribuição para o crescimento em qualquer grande País é marginal. O grosso do investimento é de origem doméstica, do investidor brasileiro, sempre foi assim na história econômica do Brasil, dos EUA, da China, da Índia, do Canadá, o salvador da economia não vem de fora, ele está dentro do País.

Esse “investidor estrangeiro” louvado pela mídia e o que alimenta as corretoras e bancos de investimento, o especulador que entra-e-sai do mercado apostando em câmbio, bolsa e juros, mais ainda, boa parte deles é brasileiro operando por off shores do Caribe ou da Europa, disfarçado de estrangeiro para ter maior proteção, benefícios fiscais e esconder a origem.

MITO DO BANCO CENTRAL INDEPENDENTE

O conceito de banco central independente vem de uma raiz norte-americana que é COMPLETAMENTE DIFERENTE do que se pretende impor no Brasil. O Federal Reserve System criado em 1913 tem DOIS objetivos na Lei que o criou: estabilidade monetária e pleno emprego. Aqui só tem UM objetivo, a estabilidade monetária, o que é possível conseguir paralisando a economia, que é exatamente o que o nosso banco central faz e gosta de fazer.

Com recessão se consegue inflação baixa porque grande parte da população não tem emprego e renda e não tem como comprar, portanto aí se garante a baixa inflação, portanto nosso BC gosta do desemprego e recessão, não dizem isso claramente, mas comentaristas intelectualmente ligados ao BC dizem abertamente que o desemprego é bom para garantir a inflação na meta, falam isso com a maior tranquilidade e desfaçatez (alô Globonews).

Por outro lado o Federal Reserve é independente, inclusive do sistema financeiro, o nosso BC sempre foi aparelhado pelo sistema financeiro, o atual Presidente era diretor do Banco Itaú até ir para o BC, isso não ocorre com o Federal Reserve, onde todos os membros do Board são tradicionalmente economistas acadêmicos de alta reputação NÃO LIGADOS AO SISTEMA FINANCEIRO, por uma regra não escrita quem é do mercado financeiro não dirige o FED.

Portanto, a independência que se pretende no Brasil é a ENTREGA DO CONTROLE DO BC AO SISTEMA FINANCEIRO, não é na linha da independência do Federal Reserve.

A proposta de independência do Banco Central NÃO é a mesma do conceito internacional de independência dos bancos centrais, é viciada pela tradição brasileira de nomear diretores do Banco Central vinculados ao mercado financeiro, vêm desse sistema, ocupam cargos no BC e depois voltam para o sistema financeiro. ESSA INDEPENDENCIA NÃO SERVE e trai o conceito Internacional de independência de Banco Central porque esses dirigentes vão trabalhar exclusivamente nos interesses do mercado financeiro e não do conjunto da economia.

https://jornalggn.com.br/noticia/porque-o-mercado-escolheu-goldfajn

MITO DA INFLAÇÃO

A moeda é um instrumento não é um dogma. Os economistas monetaristas, sub-função de “economistas de mercado” tratam a moeda como adoradores de estátuas. A moeda deve ser usada para o bem estar da população em diferentes ciclos, por vez deve ser expandida para gerar emprego e renda mesmo com algum risco de inflação, outras deve ser contraída para reduzir a inflação, depende das circunstâncias, os países inteligentes fazem isso, o Banco do Japão até 2017 tinha como objetivo gerar inflação para destravar a economia, o Brasil tem uma recessão causada por falta de renda e empego, quadro onde a expansão monetária é um instrumento perfeitamente adequado e historicamente praticado para sair da recessão.

Mas há um problema: um programa desse tipo exige economistas ecléticos, de múltipla visão, como Roberto Campos, Delfim Neto, Mario Henrique Simonsen, fora do Brasil um Hjalmar Scgacgt, John Maynard Keynes, Alan Greenspan. Economistas limitados simplesmente não conseguem operar dentro das circunstâncias, são cozinheiros de um prato só.

MITO DA PRIVATIZAÇÃO

O jornal “Estado de S. Paulo”, paladino da privatização desde os anos 50, publica manchete enganosa “Brasil campeão de estatais” (3.11.18 -Pag.B1). Faz comparação do Brasil com os países da OCDE, onde estão Bélgica, Luxemburgo e Dinamarca, pequenos países incomparáveis com o Brasil em qualquer tema. O Brasil segundo a matéria, conta com 418 estatais, outro erro, subsidiárias de estatais fazem parte de um só grupo, a Eletrobrás tem mais de duas dezenas de subsidiárias, outro critério errado, companhias de águas e esgotos estão sob forma estatal por razões legais, na Europa elas são também públicas na maioria dos casos, mas não são empresas e sim entes públicos, é outra forma legal, mas também é estatal.

O Brasil deveria se comparar à Índia com mais de 600 estatais, com a Rússia, com mais de 550 e a China com 1.600 estatais e não com Suécia ou Áustria. Nos EUA cada cidade média e grande tem serviços de água e de transportes metropolitanos ESTATAIS, mas não são sob forma de empresa e sim de “Authority”, que é um ente estatal sem o nome de empresa, como a Port Authority of New York, todos os portos americanos têm essa forma, no Brasil se usa “Companhia Docas”, nos EUA se usa “Port Authority” são todas ESTATAIS, só a capa legal é diferente, nos EUA a energia hidroelétrica é estatal, assim como rodovias, aeroportos, metrôs e ônibus, é tudo ESTATAL mas não usam o nome de empresa como no Brasil.

Então, é um problema de nomenclatura e não de natureza, tem muita atividade econômica estatal no mundo desenvolvido, mas para o ESTADÃO é importante dizer que nós somos campeões de estatais para assim fazer campanha pela privatização. Nos EUA eles NÃO têm praticamente rodovias com pedágio privatizado, como empresas como a CCR e os ônibus de Nova York são estatais, assim como o aeroporto Kennedy, já aqui os ônibus são privados e o aeroporto de Guarulhos é privado, notícia manipulada para encobrir a realidade.

MITO DA ECONOMIA ABERTA, DA PRODUTIVIDADE E DA COMPETITIVIDADE

Em cidade do interior paulista de 70 mil habitantes onde convivo, cinco supermercados. O menor deles tem duas marcas de água mineral francesa, seis marcas de cervejas importadas, inclusive duas tchecas muito caras, macarrão italiano se encontra até em padarias e vendinhas de bairro, suco de tomate americano, suco de laranja da África do Sul, vinhos de todo o mundo, biscoito dinamarquês, presunto cru espanhol, bacalhau e azeite português até em feiras de cidades pequenas do interior de Minas, já no caso do mercado financeiro, não existe mais controle do Banco Central, a antiga FIRCE, para remeter milhões de dólares para fora do Pais a qualquer pretexto, o mercado de câmbio é livre, desde 2013 os bancos se autorregulam, como em Nova York e Londres, no entanto economistas neoliberais repetem em entrevistas o mantra “A economia brasileira é das mais fechadas do mundo” mas fechada onde?

Importa-se tudo, o essencial e o supérfluo, nos camelôs de rua predomina o importado, a cidade de Americana no interior de São Paulo chegou a ter 600 tecelagens, hoje é uma antiga lembrança, importa-se não só tecido como roupa pronta da China, tênis do Vietnam dominam o mercado, mas os papagaios repetem “A economia brasileira é das mais fechadas do mundo”, é um bordão para justificar o que? Nos EUA muito mais coisas são proibidas a estrangeiros, até terminais portuários, empresas de energia, indústrias de alta tecnologia, meios de comunicação, linhas aéreas. No Brasil a maior empresa de aviação tem controle estrangeiro de fato, a comercialização de grãos é um cartel multinacional, a primeira e a segunda maiores distribuidoras de energia têm controle estrangeiro, toda a transmissão de energia, depois da Eletrobrás, tem controle chinês e italiano, mas os realejos repetem “A economia brasileira é das mais fechadas do mundo”, onde é fechada?

Não é preciso nenhuma tese acadêmica para saber que as economias americana, chinesa, russa e indiana são muito mais fechadas do que a economia brasileira, na China banco estrangeiro com rede de agências nem pensar, tampouco na Índia ou na China e muito menos corporações estrangeiras controlarem escolas e seguro saúde, aqui no Brasil pode e acontece.

O mesmo conceito de bordão têm a “produtividade” e a “competitividade”, que segundo os neoliberais o Brasil não tem, mesmo assim é o maior exportador de soja, de carne de frango, o segundo de carne suína e bovina, grande exportador de calçados, de ferro e aço para construção, de auto peças, mas os periquitos repetem o mantra “o Brasil não tem competitividade porque falta produtividade”, haja bordão de almanaque.

Produtividade e competitividade são conceitos absolutamente relativos dentro de tempo e espaço, a simples definição é complexa e controversa, é um bordão ficcional.

O FASCÍNIO DAS FÓRMULAS FIXAS

As mentes pouco sofisticadas de muitos economistas tem fascínio por fórmulas fixas e simplórias, que ajudam mentes preguiçosas e mal equipadas, incultas e antiquadas.

Daí nascem as “lições de casa” do FMI, os “tripés macroeconômicos” do defunto Consenso de Washington, reducionismos primitivos da complexa realidade política, social e econômica.

Sim, porque NÃO existe economia desligada do político e do social. Economia não funciona no vácuo, numa redoma de laboratório, a economia é apenas uma parte de um vasto sistema caótico que mistura na mesma panela as tensões sociais, demográficas, regionais, culturais, é absurdo pretender reger a economia por cartilhas simplificadoras, como pretendia Milton Friedman, que ao fim da vida teve a honestidade de rever muito de suas convicções em conversa com seu amigo pessoal e inimigo intelectual Alan Greenspan.

Keynes e Schacht, os dois maiores economistas do Século XX poderiam operar em qualquer faixa de onda, na ortodoxia e na heterodoxia, a depender das circunstâncias.

Outro gigante entre os economistas da segunda metade do Século XX, Albert Hirschman, alemão de formação francesa e um dos fundadores do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de Princeton ensina “Sempre a mesma receita para doenças diferentes, que médicos são esses?”, referindo-se aos economistas ortodoxos, ver suas memórias em português com o título AUTO SUBVERSÃO, prefácio de Fernando Henrique Cardoso.

A economia das fórmulas fixas está em completa decadência intelectual em todo o mundo, menos no Brasil onde economistas que estudaram nos antigos templos neoliberais americanos continuam apegados à sua cartilha de estudantes quando a ciência de há muito evoluiu, como no caso do positivismo, o Brasil é o último refúgio das ideologias toscas.

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

A batalha pela lucidez

Meu novo artigo:


As eleições presidenciais indicam que o País mergulhou de cabeça na chamada Guerra Híbrida, cuja ferramenta principal encontra-se na luta de ideias, através da grande mídia tradicional, especialmente em sua versão on line. Mas sobretudo pelas Redes Sociais.

A Guerra da Informação vem se distanciando cada vez mais dos fatos concretos, da realidade objetiva, como um jogo de espelhos distorcidos, e em seu lugar assume a versão que tanto pode ser real ou inteiramente falsa, as Fake News.

Tanto faz nessa Guerra Digital o compromisso com a verdade, o que importa é a arregimentação de forças na sociedade em torno de um conjunto de concepções que substituem as formulações Históricas, filosóficas, inclusive aquelas de natureza científicas, quando se trata de distorcer os conceitos comprovados pela vida, em favor de uma espécie de agenda empacotada e previamente estabelecida.

O mundo paralelo da Pós Verdade vai sendo imposto. Na prática, uma ficção que substitui a realidade objetiva.

O resultado é o surgimento de uma neurose coletiva, atingindo centenas de milhões de pessoas em todo o mundo, provocando doenças psicossociais como o pânico, depressão, ansiedade e o sentimento de desrealização, que passam a ter novos sintomas além dos que a medicina já identificava.

São características neuróticas que exigem novos estudos comportamentais na psiquiatria, psicologia, psicanálise etc. Já no campo das ciências sociais as formulações passam a ter sentido distinto dos que eram usados antes.

Dessa forma, o conceito de Esquerda passa a ter novo significado e já não corresponde às formulações vistas como universais. É o caso das Políticas Indentitárias que passam a ser definidas como a “Esquerda”.

De outro lado a caracterização de “Direita” já não corresponde às fórmulas utilizadas até então.

No âmbito da Economia, o conceito de Liberal também foi reprogramado na Pós Verdade. O liberalismo econômico clássico já não mais é visto como tal.

Com o processo de centralização do capital financeiro em escalas antes inimagináveis, todas essas formulações vêm servindo aos desígnios do capital predador, sua influência e capacidade de interferência global, que passou a ser descomunal.

As pessoas convivem atualmente com definições, na maioria das vezes, com sinais falsos, trocados ou invertidos. Não é de espantar a desorientação generalizada e a confusão mental decorrentes.

Embora esses fenômenos não tenham surgido de maneira fulminante, eles foram rápidos o suficiente para gerar o caos cognitivo que vivemos no presente.

Existe uma diferença entre Fake News e a notícia na grande na mídia. No primeiro caso ela é uma invenção absolutamente mentirosa. Enquanto na grande mídia o fato é usado com o viés ideológico que interessa ao grupo jornalístico e ao campo financeiro ao qual ele é ligado. Portanto temos uma distância efetiva da realidade em ambos os casos.

E tudo isso serve a uma luta cuja origem reside na disputa entre corporações globais, que podem estar associadas ou não a interesses de grandes potências mundiais. E em muitos casos de forma combinada.

Seja como for, os objetivos de expansão, domínio do capital financeiro e das potências mundiais estão em curso e em pleno movimento contra os interesses das nações, suas riquezas materiais, financeiras, culturais, dos povos em geral.

A cultura por exemplo, vem sendo hegemonizada e expandida através de corporações gigantes de entretenimento com viés ideológico e temático que lhes são úteis.

O mega especulador financeiro George Soros entregou 32 bilhões de dólares (118 bilhões de reais) à sua principal organização, a Open Society Foundations, para ser usado na “construção da democracia nos EUA e no mundo”, além de 75 milhões de dólares (277 milhões de reais) para candidatos e comitês somente nos EUA ao longo dos anos.

Mas esses valores não incluem os muitos milhões de dólares que ele doou a ONGs sem fins lucrativos e que não são declarados.

Por outro lado, Charles e David Koch e outros doaram 2 bilhões de dólares (7,4 bilhões de reais) a grupos adversários aos interesses de George Soros também para “promover políticas públicas e candidatos”.

Já Steve Bannon, que tem relações com financistas e especuladores, assessor e uma espécie de estrategista do presidente Donald Trump, diz que o seu adversário Soros é “vilipendiado porque é eficaz” e que as recentes ameaças com bomba que ele recebeu é “o preço que se paga para entrar nessa brincadeira”.

“Brincadeira” de um clube global privê com reduzidíssimo número de sócios que mandam em grande parte do planeta, é bom que se diga. Steve Bannon representa um time de financistas que se intitula “radical de direita” em oposição a Soros, visto por esses bilionários como financiador de grupos que eles chamam de “esquerda radical”.

Essa disputa envolve hoje o mundo todo, inclusive até na pequena, ex-socialista Albânia, para se ter uma noção da expansão e áreas de influência dessa competição. Não existem espaços vazios para eles.

Esses dois personagens de linhas opostas das finanças globais, George Soros e Steve Bannon, vêm atuando intensamente no Brasil, já faz um bom tempo.

As informações aqui citadas, e outras mais, encontram-se publicadas no The New York Times em matéria assinada pelos jornalistas Kenneth P. Vogel, Scott Shane e Patrick Kingsley.

A verdade é que bilionários e mega especuladores globais estão se apropriando e reconfigurando conceitos ideológicos, competindo entre eles em escala internacional, ditando as formas dos conflitos entre movimentos sociais, vários deles antagônicos, que fervilham pelas nações do mundo. Além disso, a influência desses grupos da globalização especulativa nas Redes Sociais tem sido intensa, e com efeitos devastadores para as suas centenas de milhões de usuários.

Na complexidade desses novos tempos importa compreender os fenômenos em curso no planeta.

E acima de tudo lutar para manter a lucidez intelectual, política, a defesa de um Projeto Nacional de Desenvolvimento inserido na nova, intensa, aberta, competitiva e dinâmica economia internacional. Mas voltado para os interesses soberanos do País, de conteúdo democrático, com a justiça social.

Essa é a via que favorece a sociedade nacional e o Brasil, como protagonista no teatro geopolítico da comunidade internacional dos Estados nações.

Que aliás é o seu papel em função de sua dimensão territorial continental, liderança regional hemisférica, riquezas naturais, cultura e população. E até pela simples razão de que esse é o único caminho que nos reserva um futuro digno e promissor.

segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Três bandeiras

Meu novo artigo:


Uma geração de combatentes políticos, ou pelo menos parte dela, que surgiu durante a luta contra o regime civil-militar de 1964 a 1985, tinha três referências centrais: a luta pelos direitos dos trabalhadores, a intransigente batalha pelas amplas liberdades democráticas e a defesa da soberania nacional, do Brasil.

A visão de muitos desses militantes tem sido norteada, até os dias atuais, por essas três consignas como cláusulas pétreas seja como ativistas políticos, na produção intelectual, ou simples cidadãos e cidadãs.

A defesa dos direitos dos trabalhadores, valorização radical das liberdades políticas, das fundamentais garantias democráticas, e a defesa do Brasil são para essa geração, questões de princípios inegociáveis.

É bom lembrar que o período da luta contra o arbítrio coincidiu com a época da chamada Guerra Fria, onde dois grandes campos, Estados Unidos, parte dos Países ocidentais e as nações do chamado campo socialista sob a liderança da extinta URSS, disputavam a hegemonia territorial, ideológica e geopolítica no planeta.

Estados como a França, de grandes tradições e protagonismo internacional procuraram exercer a sua própria liderança mundial, sob intensa pressão dos dois gigantes globais, EUA e URSS.

Charles de Gaulle, herói da resistência francesa contra as hordas nazistas expansionistas, que na Segunda Guerra Mundial ocuparam, inclusive, a Europa e a França, disse certa vez anos após o fim do conflito mundial e como presidente francês durante a Quinta República que: só é possível entender a Guerra Fria se nos detivermos sobre os interesses específicos de Estado dos EUA e da URSS que os moviam na época.

De fato, muitos historiadores e cientistas políticos hoje afirmam, com base em farta documentação, que as explosões estudantis em Maio de 1968, sob liderança de grupos anarquistas, tinham como objetivo anular o crescente papel internacional independente da França e desmoralizar De Gaulle submetendo a França à bipolarização mundial.

O golpe de Estado de 1964 no Brasil efetivou-se por várias razões, pelos interesses e manutenção de privilégios arcaicos de grande parte das elites econômicas nativas. Mas foi exatamente a Guerra Fria o fator decisivo, com o apoio direto dos EUA, fartamente comprovado, contra o governo constitucional do presidente João Goulart.

Hoje não mais existe a bipolarização mundial com a debacle da URSS. Durante anos tivemos o período da unipolaridade global sob a liderança inconteste dos EUA.

Agora vivemos a época da multipolaridade geopolítica, econômica e militar com o protagonismo dos Estados Unidos, China, segunda economia global, da Rússia, Índia e o Brasil. Com o final da Guerra Fria, desparece também a Guerra ideológica que a movia febrilmente.

Mas surge uma nova Guerra Ideológica sob as condições do mundo reconfigurado. É a Guerra Híbrida que pode ser usada pelas grandes potências para sustar os novos protagonistas em ascensão, como é o caso do Brasil. E ela tem sido usada em nosso País de forma intensa desde, pelo menos, 2013. O objetivo central tem sido a fratura da sociedade nacional, retardar o crescimento econômico, o desenvolvimento do País, o seu papel de player diplomático e comercial, num cenário internacional multipolar em desenvolvimento acelerado.

Além do mais, com a crise econômica e financeira global de 2008, houve um brutal processo de acumulação e centralização do Capital Especulativo que não investe na produção mas no lucro rápido a curto prazo.

Quanto maior a crise econômica (e social) das nações, maior o lucro desse capital parasitário e predador. Mas o capital especulativo, que concentra para si a maior parte das finanças globais, também investe fortemente na chamada Guerra Cultural Ideológica aproveitando-se das formulações dos “novos filósofos” surgidos em Maio de 1968 em Paris, adequando suas teses ao século XXI.

A lacerante crise econômica que se abate sobre o Brasil, a crise da segurança pública com o narcotráfico transnacional que faz rota e escala no Brasil, a defenestração da vida política institucional, e outras questões, resultaram na “Tempestade Perfeita” nesta campanha presidencial.

Onde a agenda predominante não foram as soluções econômicas, sociais, de infraestrutura, saúde, educação etc., para retirar a nação da crise e apontar novos rumos ao crescimento econômico, a inclusão de milhões de desempregados no mercado de trabalho.

O que assistimos foi uma Guerra Cultural extremamente polarizada pelo ódio. E a crise pode se desdobrar com a predominância do liberalismo econômico radical.

Daí a atualidade das três grandes bandeiras que sempre unificaram o povo brasileiro: a defesa dos direitos dos trabalhadores, a defesa intransigente das liberdades democráticas e a defesa do Brasil. O que exige a reunificação da sociedade nacional, o desenvolvimento soberano do País, seu protagonismo em condições de uma geopolítica multilateral em acelerada reconfiguração.